terça-feira, 5 de julho de 2022

Escritor do mês | julho e agosto

 José Eduardo Agualusa

(1960-…)

“Velho Caxombo sonhou com o mar”

Na última tarde da sua vida, quando depois do costumeiro almoço de fungi e quizaca se estendeu na esteira para gozar a sesta, o velho Caxombo sonhou com o mar.(…) O sol declinava quando, numa angústia crescente, se deu conta de que qualquer coisa estava errada e ele não sabia o que era. De súbito enchia tudo. Um silêncio espesso como uma noite sem lua. Não havia pássaros. Todos os pássaros se tinham ido embora. (…).

Então Caxombo dobrou-se sobre si mesmo, como um bicho-de-conta, e enterrando a cabeça entre as mãos fechou os olhos.

- Estou a sonhar – gemeu baixinho – é claro que estou a sonhar.

In D. Nicolau Água-Rosada e outras estórias verdadeiras e inverosímeis


José Eduardo Agualusa [Alves da Cunha] nasceu no Huambo, Angola. Estudou Silvicultura e Agronomia em Lisboa. Os seus livros estão traduzidos para mais uma dezena de idiomas. Também escreveu várias peças de teatro: “Geração W”, “Chovem amores na Rua do Matador”, juntamente com Mia Couto, e o monólogo “Aquela mulher”. Beneficiou de três bolsas de criação literária: a primeira, concedida pelo Centro Nacional de Cultura em 1997 para escrever «Nação crioula», a segunda em 2000, concedida pela Fundação Oriente, que lhe permitiu visitar Goa durante 3 meses e na sequência da qual escreveu “Um estranho em Goa” e a terceira em 2001, concedida pela instituição alemã Deutscher Akademischer Austauschdienst. Graças a esta bolsa viveu um ano em Berlim, e foi lá que escreveu «O ano em que Zumbi tomou o rio». No início de 2009 a convite da Fundação Holandesa para a Literatura, passou dois meses em Amsterdam na Residência para Escritores, onde acabou de escrever o seu romance, «Barroco tropical».

Escreveu crónicas para a revista portuguesa LER e o portal Rede Angola. Escreve crónicas para o jornal brasileiro O Globo e para a revista portuguesa Visão. Na RDP África é realizador do programa A Hora das Cigarras, sobre música e poesia africana.

É membro da União de Escritores Angolanos. Em 2006 lançou, juntamente com Conceição Lopes e Fátima Otero, a editora brasileira Língua Geral, dedicada exclusivamente a autores de língua portuguesa.


OBRA

D. Nicolau Água-Rosada e outras estórias verdadeiras e inverosímeis (1990); Fronteiras perdidas, contos para viajar (1999); Estranhões e Bizarrocos (2000); A substância do amor e outras crónicas (2000); Um estranho em Goa (2000); O ano em que Zumbi tomou o rio (2002); O homem que parecia um domingo (2002); Catálogo de sombras (2003); O vendedor de passados (2004); A girafa que comia estrelas (2005); As mulheres de meu pai (2007); Passageiros em trânsito (2007); Na rota das especiarias (2008); Barroco tropical (2009); Milagrário pessoal (2010); Teoria geral do esquecimento (2012); Os vivos e os outros (2019). 




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