quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Um poema...



Velho, velho, velho
Chegou o Inverno.

Vem de sobretudo,
Vem de cachecol,

O chão onde passa
Parece um lençol.

Esqueceu as luvas
Perto do fogão:

Quando as procurou,
Roubara-as um cão.

Com medo do frio
Encosta-se a nós:

Dai-lhe café quente
Senão perde a voz.

Velho, velho, velho.
Chegou o Inverno.


Eugénio de Andrade (1923 –2005) in Aquela nuvem e outras

Escritor do mês | fevereiro

Kazuo Ishiguro

(1954/ )


Kazuo Ishiguro nasceu em Nagasáqui, Japão, em 1954, e vive na Grã-Bretanha desde os cinco anos, quando o seu pai foi aceite como investigador no National Institute of Oceanography.

Educado numa escola de rapazes em Surrey, frequentou, mais tarde, a Universidade de Kent, na Cantuária, onde se especializou em língua inglesa e filosofia. Tirou o mestrado em escrita criativa na Universidade de East Anglia, em 1980. O seu primeiro emprego, depois de ter concluído os estudos superiores, foi o de assistente social nos bairros mais pobres de Londres.

Em 1995 foi feito Oficial da Ordem do Império Britânico, por serviços prestados à literatura, e em 1988 recebeu a condecoração honorífica francesa de Chevalier de L’Ordre des Arts et des Lettres.

No total, Ishiguro já conta com nove obras publicadas — a primeira, “Introductions 7: Stories by New Writers”, foi editada em 1981 e a mais recente, “O Gigante Enterrado”, chegou às lojas em 2015. Outros títulos publicados: Os Despojos do Dia (1989, vencedor do Booker Prize; adaptado ao cinema), Os Inconsolados (1995, vencedor do Cheltenham Prize), Quando Éramos Órfãos (2000, nomeado para o Booker Prize), Nunca me Deixes (2005, nomeado para o Booker Prize; adaptado ao cinema), Nocturnos (2009). É, ainda, autor de argumentos para cinema.

Foi considerado pela organização sueca dos Prémios Nobel “um romancista absolutamente brilhante” que “desenvolveu um universo estético só seu” em “romances de grande força emocional”.

É o vencedor da edição de 2017 do Prémio Nobel da Literatura.


Creio que caminhava um pouco ao longo da berma da estrada, espreitando pelo meio do arvoredo, na esperança de lobrigar uma vista melhor, quando ouvi uma voz atrás de mim. Até essa altura, evidentemente, julgara-me completamente só, e por isso virei-me com alguma surpresa. Um pouco acima da estrada, no lado oposto, vi o começo de um carreiro que desaparecia, íngreme, entre as moitas. Sentado numa grande pedra, que assinalava o local, encontrava-se um homem magro, de cabelo branco e boné de fazenda, a fumar cachimbo. (…)
-Perguntava, aqui, aos meus botões- disse ele, quando me aproximei- se as suas pernas estariam em forma.
-Como?
O indivíduo apontou para o cimo do carreiro.
-É preciso ter um bom par de pernas e de pulmões para ir lá acima. Eu não tenho nem uma coisa nem outra; por isso, fico cá em baixo. Mas, se estivesse em melhor estado de saúde, era lá em cima que estaria. Há um lugarzinho agradável com um banco e tudo. E acredite que não encontrará uma vista melhor em lugar algum de toda a Inglaterra.
-Se o que diz é verdade- respondi, - acho que prefiro ficar aqui. Estou no início de uma viagem de automóvel, durante a qual espero encontrar muitas vistas esplêndidas. Ver a primeira antes de ter, a bem dizer, começado seria algo prematuro.

Os Despojos do dia, cap. 1º, pág. 29


O Leituras sugere...





...para fevereiro 


O Gato e o Escuro
Mia Couto

Danuta Wojciechowska


O motivo principal deste livro é o escuro, com os temores e medo que provoca.  São tão graves que o próprio escuro se assusta consigo próprio. Quem o salva? É o gatinho desobediente, que, contra o que lhe disse a mãe gata, não resiste e passa para o lado escuro do dia, e fica escuro.

Quem os salva, ao gatinho e ao escuro, é a mãe e os seus grandes olhos, amarelos com uma fenda preta ao meio. Claro, escuro, às cores, tudo faz parte do nosso mundo. E o escuro que faz medo é só aquele que está escondido dentro de nós.

As ilustrações da Danuta Wojciechowka dão à escrita de Mia Couto a forma gráfica perfeita.

Plano Nacional de Leitura
Livro recomendado para o 4º ano de escolaridade, destinado a leitura autónoma.