Ana Luísa Amaral
(1956/2022)
Ana
Luísa Ribeiro Barata do Amaral nasceu em Lisboa a 5 de abril de 1956, e morreu
a 5 de agosto de 2022, no Porto.
Com
nove anos de idade deixou Sintra e foi viver para Leça da Palmeira, distrito do
Porto.
A
sua infância foi marcada pela leitura de obras de autores anglo-saxónicos, como
Walter Scott (1771-1832), Washington Irving (1783-1859), Louisa Alcott
(1832-1888) e Enid Blyton (1897-1968).
Entre
os dez e os dezasseis anos de idade frequentou um colégio de freiras espanholas
e, mais tarde, estudou Germânicas na Faculdade de Letras da Universidade do
Porto, onde veio a lecionar.
Em
1985 realizou provas de aptidão pedagógica e capacidade científica na
especialidade de Literatura Inglesa. Novamente na Faculdade de Letras da
Universidade do Porto, em 1996, defendeu provas de doutoramento na
especialidade de Literatura Norte-Americana, tendo sido aprovada com distinção
e louvor. A tese que apresentou intitula-se Emily Dickinson: uma poética de
excesso.
Durante
a década de 80 deslocou-se pontualmente a Inglaterra. Viveu nos Estados Unidos
da América entre 1991 e 1992.
A
sua obra, povoada de referências a viagens e lugares, está representada em
várias antologias, nacionais e estrangeiras, e traduzida em diversas línguas.
É
autora dos livros de poesia: Minha
Senhora de Quê (1990), Coisas de
Partir (1993), Epopeias (1994), E Muitos Os Caminhos (1995), Às Vezes o Paraíso (1998), Imagens (2000), Imagias (2002), A Arte de
ser Tigre (2003), A Génese do Amor (2005), Poesia Reunida 1990-2005 (2005), Entre Dois Rios e Outras Noites (2007), Se Fosse um Intervalo (2009), Inversos, Poesia 1990-2010 (2010), Vozes (2011), Escuro (2014), E Todavia (2015), Em suma, Poesia 1990-2015 (2016), What's
in a name,
(2017), Ágora (2019), Mundo (2021, no prelo).
Escreveu
os livros infantis Gaspar, o Dedo
Diferente e Outras Histórias (1.ª edição de 1999, edição revista de 2011), A História da Aranha Leopoldina (2000), A Relíquia (2008), Auto de Mofina Mendes a partir da peça de Gil Vicente (2008), A Tempestade (2011, que integra o plano
nacional de leitura), Como Tu (2012), acompanhado de um CD com música de
António Pinho Vargas, piano de Álvaro Teixeira Lopes e vozes de Pedro Lamares,
Rute Pimenta e Ana Luísa Amaral; integra o plano nacional de leitura) e Lenga-lenga de Lena, a Hiena (2016).
Publicou
uma peça de teatro - Próspero Morreu
(2011) e uma obra de ficção - Ara,
Sextante (2013).
Fez
traduções de poemas de Xanana Gusmão, Eunice de Souza, John Updike, Emily
Dickinson, de sonetos de Shakespeare e da obra Carol de Patricia Highsmith.
Ana
Luísa Amaral foi também coautora do Dicionário
de Crítica Feminista (2005) e coordenadora da edição anotada de Novas Cartas Portuguesas (2010).
Em
2007 foi-lhe atribuído o Prémio Literário Casino da Póvoa/Correntes d'Escritas,
com o livro A Génese do Amor e foi
galardoada em Itália com o Prémio de Poesia Giuseppe Acerbi. Em 2008, o seu
livro Entre Dois Rios e Outras Noites
alcançou o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores.
Venceu ainda o Prémio de Poesia António Gedeão com a obra Vozes (em 2010), o Prémio Narrativa PEN CLUB com Ara (2014) e a Medalha de Ouro da Câmara
Municipal de Matosinhos, por serviços prestados à literatura (2015). Foi
finalista do Prémio Portugal Telecom com A
génese do Amor (2008) e Vozes
(2014) e proposta para o Prémio Rainha Sofia em 2013. Em 2018 o seu livro Arder a palavra e outros incêndios foi
um dos vencedores do Prémio de Ensaio Jacinto Prado Coelho, da Associação
Portuguesa dos Críticos Literários.
Ana
Luísa Amaral era membro do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa.
Fonte:
(Universidade do Porto Digital / Gestão de Documentação e Informação)
O
olhar diagonal das coisas, publicado em
abril deste ano, é uma compilação de todos os seus 17 títulos de poesia. É com
dois poemas deste livro, um sobre incompletudes, essa «insuficiência tão
brutal» que a morte nos impõe, e outro, luminoso, sobre a felicidade de
escrever, que assinalámos a passagem desta poetisa para o plano infinito dos
poetas.
INCOMPLETUDES
os
meus olhos pousados
quase
na mesma flor desse jardim,
eu
sentada em degrau de casa
alheia
A
noite traz sabores
insuspeitados,
uma
liquidez quase
do
olhar
(a
morte
deve
vir desta maneira:
numa
suspeita que não chega
a
ser)
pelos
degraus acima
a
minha sombra vive,
desigual.
a
palavra chegou,
mas
incompleta
Numa
insuficiência tão brutal
como
morrer
no
meio de um descampado,
ignorante
do raio.
PROSAÍSMOS
Se
fazer versos fosse fazer histórias
a
mesma coisa igual (ou semelhante):
enredo,
uma estrutura que se visse
até
por arabescos no papel
–
aqui: a sua fala, ali: uma
montanha
emoldurando um corpo, o pôr-
-do-sol
descrito, uma cidade, um rosto.
Ou
sem enredo, mas sempre estrutura
(precisos
arabescos na legitimação
do
desejado). Associações também:
o
nevoeiro, um cavalo dourado
sem
herdeiro, mas coberto o bastante.
Se
fosse assim, a mesma coisa igual
(ou
semelhante) entre o fazer da história
e
o do verso: desistia de tudo.
Chegava-me
a montanha para olhar,
uma
janela aberta ao fim do sol,
perder-me
na cidade (em imagens comuns,
como
esta agora). Seria então feliz
no
prazer de saber que não fazia
nem
história, nem o resto que era o verso,
pelo
prazer sublime do prazer
puro,
plano, rosado (como o rosto).
A
história por escrever, mas eu feliz.
O
verso por fazer. E (eu) mais feliz.
Ana Luísa Amaral, O Olhar Diagonal das Coisas
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