Uma pequenina luz
Uma
pequenina luz bruxuleante
não
na distância brilhando no extremo da estrada
aqui
no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una
picolla... em todas as línguas do mundo
uma
pequena luz bruxuleante
brilhando
incerta mas brilhando
aqui
no meio de nós
entre
o bafo quente da multidão
a
ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o
sopro azedo dos que a não vêem
só a
adivinham e raivosamente assopram.
Uma
pequena luz
que
vacila exacta
que
bruxuleia firme
que
não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe
voz ouviram-na e é muda.
Muda
como a exactidão como a firmeza
como
a justiça.
Brilhando
indefectível.
Silenciosa
não crepita
não
consome não custa dinheiro.
Não
é ela que custa dinheiro.
Não
aquece também os que de frio se juntam.
Não
ilumina também os rostos que se curvam.
Apenas
brilha bruxuleia ondeia
indefectível
próxima dourada.
Tudo
é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo
é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo
é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo
é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde
sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma
pequenina luz bruxuleante e muda
como
a exactidão como a firmeza
como
a justiça.
Apenas
como elas.
Mas
brilha.
Não
na distância. Aqui
no
meio de nós.
Brilha.
Jorge
de Sena, in Antologia Poética, Guimarães Editora, 2010
Em
tempos difíceis da nossa história comum, a esperança, exposta à força das
contrariedades ou dos contrariados, pode parecer assim: trémula, vacilante,
inútil. No entanto, permanece como uma declaração de sentido, maior e mais além
– brilha. Deixá-la brilhar, protegê-la, apontá-la aos que nunca a viram ou a
deixaram de ver, podem ser - no meio de nós - pequeninas parcelas de luz.
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