OS PASTORES
Guardavam certos pastores
seus rebanhos, ao relento,
sobre os céus consoladores
pondo a vista e o pensamento.
Quando viram que descia,
cheio de glória fulgente,
um anjo do céu do Oriente,
que era mais claro que o dia.
Jamais os cegara assim
luz do meio-dia ou manhã.
Dir-se-ia o audaz Serafim,
que um dia venceu Satã.
Cheios de assombro e terror,
rolaram na erva rasteira.
– Mas ele, com voz fagueira,
lhes diz, com suave amor:
«Erguei-vos, simples, daí,
humildes peitos da aldeia!
Nasceu o vosso Rabi,
que é Cristo – na Galileia!
Num berço, o filho real,
não o vereis reclinado.
Vê-lo-eis pobre e enfaixado,
sobre as palhas de um curral!
Segui dos astros a esteira.
Levai pombas, ramos, palmas,
ao que traz uma joeira
das estrelas e das almas!»
Foi-se o anjo: e nas neblinas,
então celestes legiões
soltam místicas canções,
sobre violas divinas.
Erguem-se, enfim, os pastores
e vão caminhos dalém,
com palmas, rolas, e flores,
cordeiros, até Belém.
E exclamavam indo a andar:
– «Vamos ver o vinhateiro!
Ver o que sabe lavrar
nas nuvens, ver o Ceifeiro!
Vamos beijar os pés nus
do que semeia nos céus.
Ver esse pastor que é Deus
– e traz cajado de luz!»
Chegando ao presépio, enfim,
caem, de rojo, os pastores,
vendo o herdeiro d’Eloim
que veste os lírios e as flores.
Dão-lhe pombas gloriosas,
Gomes Leal |
meigos, tenros animais.
– Mas, vendo coisas radiosas,
casos vindouros, fatais…
Abria o deus das crianças
uns olhos profundos, graves,
no meio das pombas mansas
– nas palpitações das aves.
Gomes Leal
PRECE DO NATAL
Menino Jesus
De novo nascido,
Baixai o sentido
Para a nossa cruz!
Vede que os humanos
Erros e cuidados
Nos são tão pesados
Como há dois mil anos.
A nossa ignorância
É um fardo que arde.
Como se faz tarde
Para a nossa ânsia!
Nós somos da Terra,
Coisa fria e dura.
Olhai a amargura
Que esse olhar encerra.
Colai o ouvido
À alma que sofre;
Abri esse cofre
Do sonho escondido.
Pegai nessa mão
Que treme de medo;
Sondai o segredo
Da minha oração.
Esta pobre gente
Que mal é que fez?
Nós somos, talvez,
Um povo «inocente»…
Menino Jesus
Que andais distraído
Baixai o sentido
Para a nossa cruz!
A mais insofrida
De tantas misérias
– Não termos mais férias
Ao longo da vida –
Trocai por amenas
Carlos Queirós |
Manhãs sem cuidados,
Silêncios banhados
De ideias serenas;
Por cantos e flores
Risonhas imagens
Macias paisagens
Felizes amores!
Carlos Queirós
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