Florbela Espanca
(1834/1930)
Florbela Espanca, poetisa portuguesa, natural de
Vila Viçosa (Alentejo).
Nasceu filha ilegítima de João
Maria Espanca e de Antónia da Conceição Lobo, criada de servir (como se dizia
na época), que morreu com apenas 36 anos, «de uma doença que ninguém entendeu»,
mas que veio designada na certidão de óbito como nevrose. Registada como filha
de pai incógnito, foi, todavia, educada pelo pai e pela madrasta, Mariana
Espanca, em Vila Viçosa, tal como seu irmão de sangue, Apeles Espanca, nascido
em 1897 e registado da mesma maneira. Note-se, como curiosidade, que o pai, que
sempre a acompanhou, só 19 anos após a morte da poetisa, por altura da
inauguração do seu busto, em Évora, e por insistência de um grupo de
florbelianos, a perfilhou.
Estudou no liceu de Évora, mas só
depois do seu casamento (1913) com Alberto Moutinho concluiu, em 1917, a secção
de Letras do Curso dos Liceus. Em outubro desse mesmo ano matriculou-se na
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que passou a frequentar. Na
capital, contactou com outros poetas da época e com o grupo de mulheres
escritoras que então procurava impor-se. Colaborou em jornais e revistas, entre
os quais o Portugal Feminino. Em 1919, quando frequentava o terceiro ano
de Direito, publicou a sua primeira obra poética, Livro de Mágoas. Em
1921, divorciou-se de Alberto Moutinho, de quem vivia separada havia alguns
anos, e voltou a casar, no Porto, com o oficial de artilharia António Guimarães.
Em 1923, publicou o Livro de Sóror Saudade. Em 1925, Florbela casou-se,
pela terceira vez, com o médico Mário Laje, em Matosinhos.
Os casamentos falhados, assim
como as desilusões amorosas, em geral, e a morte do irmão, Apeles Espanca (a
quem Florbela estava ligada por fortes laços afetivos), num acidente com o avião
que tripulava sobre o rio Tejo, em 1927, marcaram profundamente a sua vida e
obra. Em dezembro de 1930, agravados os problemas de saúde, sobretudo de ordem psicológica,
Florbela morreu em Matosinhos, tendo sido apresentada como causa da morte, oficialmente,
um «edema pulmonar».
A poesia de Florbela
caracteriza-se pela recorrência dos temas do sofrimento, da solidão, do
desencanto, aliados a uma imensa ternura e a um desejo de felicidade e
plenitude que só poderão ser alcançados no absoluto, no infinito. A veemência
passional da sua linguagem,
marcadamente pessoal, centrada nas suas próprias frustrações e anseios, é de um
sensualismo muitas vezes erótico. Simultaneamente, a paisagem da charneca
alentejana está presente em muitas das suas imagens e poemas, transbordando a
convulsão interior da poetisa para a natureza.
Florbela Espanca não se ligou claramente a qualquer movimento literário. Está mais perto do neo-romantismo e de certos poetas de fim-de-século, portugueses e estrangeiros, que da revolução dos modernistas, a que foi alheia. Pelo carácter confessional, sentimental, da sua poesia, segue a linha de António Nobre, facto reconhecido pela poetisa. Por outro lado, a técnica do soneto, que a celebrizou, é, sobretudo, influência de Antero de Quental e, mais longinquamente, de Camões.
Poetisa de excessos, cultivou exacerbadamente a paixão, com voz marcadamente feminina (em que alguns críticos encontram dom-joanismo no feminino). A sua poesia, mesmo pecando por vezes por algum convencionalismo, tem suscitado interesse contínuo de leitores e investigadores. É tida como a grande figura feminina das primeiras décadas da literatura portuguesa do século XX.
OBRA
Postumamente foram publicadas as
obras Charneca em Flor (1930), Cartas de Florbela Espanca,
por Guido Battelli (1930), Juvenília (1930), As Marcas do Destino
(1931, contos), Cartas de Florbela Espanca, por Azinhal Botelho e José Emídio
Amaro (1949) e Diário do Último Ano Seguido De Um Poema Sem Título,
com prefácio de Natália Correia (1981). O livro de contos Dominó Preto ou
Dominó Negro, várias vezes anunciado (1931, 1967), seria publicado em 1982.
Os versos
que te fiz
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.
Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer!
Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!
Amo-te tanto! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!
Florbela Espanca
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