quinta-feira, 23 de abril de 2020

DIA MUNDIAL DO LIVRO 2020

Ilustração de Mariana Rio

Mariana Rio vive no Porto. É licenciada em Design Gráfico e em Design de Comunicação pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Estudou também Academia de Belas Artes de Wroclaw, na Polónia e recebeu a menção especial do Prémio Nacional de Ilustração, em 2019. 

O Dia Mundial do Livro é comemorado desde 1996, a 23 de abril, data que coincide com a morte dos escritores Miguel de Cervantes e William Shakespeare, por decisão da organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).

Este ano, excecionalmente, não é possível assinalar esta data em convívio com crianças e escritores na nossa Biblioteca. 



No entanto, não queremos deixar de celebrar este dia dedicado aos livros e à leitura e fazemo-lo aqui, de modo digital.

É oportuno lembrar Johannes Gutenberg (1396-1468), um inventor alemão, o primeiro a usar a prensa e os tipos móveis de metal, inventos que revolucionaram a técnica de impressão.  


Quando Gutenberg nasceu, a impressão de imagens era feita através de carimbos e blocos de madeira que mal permitiam produzir textos. Ourives curioso e intelectual, Gutenberg inventa na Idade Média a prensa tipográfica. Naquela época, copiar um livro era um trabalho extraordinário. Levava tanto tempo que só os monges podiam passar dias a executar essa tarefa – em latim, é claro. Por isso, os assuntos das obras eram quase sempre religiosos. Então, Gutenberg imaginou um meio de produzir grandes quantidades de livros de forma muito mais rápida, para que qualquer pessoa alfabetizada pudesse ler sobre qualquer assunto. Associou várias técnicas de impressão e criou a imprensa. E, assim, a invenção de Gutenberg permitiu a impressão em massa de livros.

Livros e modos de ler. As nossas sugestões
Livros digitais

«As cinco ervilhas»


«O Lobo que queria mudar de cor»






Um livro, recomendado pela DGS, que é uma homenagem aos médicos, enfermeiros e a todos os profissionais de saúde.



Livro recomendado pela DGS



Com a ajuda do humor, o livro promove a saúde mental dos pais e ajuda as crianças a lidar com algumas alterações emocionais ou de comportamento. Através da construção de uma caixa de primeiros socorros apenas com objetos caseiros, a sua autora, Rute Agulhas, apresenta divertidas receitas para lidar com as birras, a tristeza, os pesadelos, a agressividade, o uso abusivo das tecnologias, os medos…




Coleção de obras integrais, para leitura gratuita, sem necessidade de registos ou subscrição, em temas como Literatura, História, Arquitetura, Música, Arte, Língua, etc. Em PDF e em formatos para dispositivos móveis.






Clube de LeYtura desafia José Fanha - Dia Mundial do Livro



Ler|Ouvir Poesia


Andante Associação Artística | Feito em casa em abril de 2020 a convite da Biblioteca Municipal de Mértola para celebrar o Dia Mundial do Livro.



"Carta de amor numa pandemia vírica". 
O último poema de Maria de Sousa


A imunologista Maria de Sousa foi uma das primeiras mulheres portuguesas reconhecidas internacionalmente pelas suas descobertas científicas, tendo-se distinguido na área da imunologia, nomeadamente na questão da distribuição dos linfócitos, o conjunto de células do sistema imunitário que defende o corpo de invasores indesejados.

Maria de Sousa viria a destacar-se pelos seus trabalhos académicos em Inglaterra, na Escócia e nos Estados Unidos. Era nos laboratórios, porém, que passava grande parte do seu tempo. “Fazer experiências é como estar embriagado“, dizia frequentemente.
Condecorada por três Presidentes da República, Maria de Sousa pode vir a ter em breve uma rua com o seu nome na cidade do Porto, onde desenvolveu a parte da sua carreira passada em Portugal.

A cientista, que morreu no dia 14 de abril, aos 81 anos, vítima de Covid-19, deixou uma última mensagem, em verso, num momento em que já se encontrava gravemente doente e percebia a morte iminente. O poema, escrito em inglês, língua em que se expressava quando escrevia poesia, foi divulgado numa tradução do médico e poeta João Luís Barreto Guimarães, pela editora Quetzal: «Neste poema - um carpe diem - a Professora Maria pede-nos para aproveitarmos o momento - “seize the day” -, enquanto a memória lhe traz um resumo de instantes, mas revela também o que é, para ela, uma cientista, a vida eterna: perdurar na memória dos outros homens. Não é um epitáfio pequeno».

Carta de amor numa pandemia vírica
Gaitas-de-fole tocadas na Escócia
Tenores cantam das varandas em Itália
Os mortos não os ouvirão
E os vivos querem chorar os seus mortos em silêncio
Quem pretendem animar?
As crianças?
Mas as crianças também estão a morrer

Na minha circunstância
Posso morrer
Perguntando-me se vos irei ver de novo
Mas antes de morrer
Quero que saibam
O quanto gosto de vós
O quanto me preocupo convosco
O quanto recordo os momentos partilhados e
queridos
Momentos então
Eternidades agora
Poesia
Riso
O sol-pôr
no mar
A pena que a gaivota levou à nossa mesa
Pequeno-almoço
Botões de punho de oiro
A magnólia
O hospital
Meias pijamas e outras coisas acauteladas
Tudo momentos então
Eternidades agora
Porque posso morrer e vós tereis de viver
Na vossa vida a esperança da minha duração

Maria de Sousa
3 de abril de 2020

Fontes: Quetzal, Observador

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Um conto...

Nasrudin e a peste

A Peste ia a caminho de Bagdá quando encontrou Nasrudin.

Este perguntou-lhe: - Aonde vais?

A Peste respondeu-lhe: - A Bagdá, matar dez mil pessoas.

Depois de um tempo, a Peste voltou a encontrar-se com Nasrudin. Muito zangado, o mullah disse-lhe: - Mentiste-me. Disseste que matarias dez mil pessoas e mataste cem mil.

E a Peste respondeu-lhe:

- Eu não menti, matei dez mil. O resto morreu de medo.

(Conto da tradição sufi.)

(O sufismo é uma vertente mística existente dentro do islamismo. Sufismo é uma palavra que deriva do termo árabe “sufi” que significa “místico”.)

(Nasrudin foi um satírico sufi e acredita-se que viveu e morreu durante o século XIII em Akshehir, perto de Cônia, capital do Sultanato de Rum, na atual Turquia).


Neste momento de pandemia, este conto lembra-nos a importância da serenidade para podermos refletir e agir convenientemente, com base numa informação séria, sem nos deixarmos influenciar por falsas notícias e alarmismos. O medo fragiliza-nos, tornando-nos mais suscetíveis a outros males, incluindo doenças.

Não entremos em pânico, mas também não sejamos negligentes.

É importante mantermos o otimismo, a fé, a esperança e desenvolvermos a solidariedade.

Um bom dia!


quinta-feira, 9 de abril de 2020

Feliz Páscoa 2020!


Um poema...


Olhamo-nos nos olhos


Olhamo-nos nos olhos pela internet.

Eu transmito-te este domingo à tarde,
a voz do vizinho através da parede.

Tu transmites-me a distância que existe
depois do que consigo ver pela janela.

Durante a noite mudou a hora e, no entanto,
continuamos no tempo de ontem.

Como é raro este domingo, não podemos
garantir que amanhã seja segunda-feira.

O futuro perdeu-se no calendário, existe
depois do que conseguimos ver pela janela.

O futuro diz alguma coisa através da parede,
mas não entendemos as palavras.

Lavamos as mãos para evitar certas palavras.

E, mesmo assim, neste tempo raro, repara:
tu e eu estamos juntos neste verso.


O poema é como uma casa, tem paredes
e janelas, é habitado pelo presente.

  
Olhamo-nos nos olhos pela internet,
estamos verdadeiramente aqui.

  
O poema é como uma casa,
e a casa protege-nos.


José Luís Peixoto, 29 de março de 2020

O Leituras sugere...





...para abril 



História de um caracol que descobriu a importância da lentidão

LUIS SEPÚLVEDA


Os caracóis que vivem no prado chamado País do Dente-de-Leão, sob a frondosa planta do calicanto, estão habituados a um estilo de vida pachorrento e silencioso, escondidos do olhar ávido dos outros animais, e a chamar uns aos outros simplesmente «caracol». Um deles, no entanto, acha injusto não ter um nome e fica especialmente interessado em conhecer os motivos da lentidão. Por isso, e apesar da reprovação dos outros caracóis, embarca numa viagem que o vai levar ao encontro de uma coruja melancólica e de uma tartaruga sábia, que o guiam na compreensão do valor da memória e da verdadeira natureza da coragem, e o ajudam a orientar os seus companheiros numa aventura ousada rumo à liberdade.

Plano Nacional de Leitura
Livro recomendado para apoio a projetos relacionados com a Educação para a Cidadania nos 3º, 4º, 5º e 6º anos de escolaridade. (9-11)

Escritor do mês | abril

OLGA TOKARCZUK
(1962/)


Prémio Nobel da Literatura 2018

Acredito numa literatura capaz de unir as pessoas e mostrar o quão semelhantes somos, que nos torna conscientes do facto de estarmos ligados por fios invisíveis. Que conta a história do mundo como se este fosse um todo vivo e uno, desenvolvendo-se de forma constante à frente dos nossos olhos, e no qual nós temos um pequeno, mas poderoso papel.”
Olga Tokarczuk

Olga Tokarczuk nasceu em Sulechów, uma pequena cidade polaca, em 1962. Feminista e ecologista, defensora dos animais e dos direitos LGBT+, Olga Tokarczuk é uma das mais jovens laureadas do Nobel de Literatura. Filha de professores, viveu os tempos da cortina de ferro, do comunismo e da guerra fria, mas também do punk e da lenta abertura.

Formada em Psicologia, publicou o seu primeiro livro em 1989, uma coletânea de poesia intitulada Miasta w lustraché (Cidade em espelho), seguindo-se os romances E. E. e Prawiek i inne czasy ((Primitivo e Outros Tempos, sendo que Primitivo é também o nome da cidade imaginária), tendo sido este último um sucesso.

A partir daí, a sua prosa afastou-se da narrativa mais convencional, aproximando-se da prosa breve e do ensaio. Uma das melhores e mais apreciadas autoras de hoje, Olga Tokarczuk tem sido alvo de várias distinções, nacionais e internacionais. Recebeu por duas vezes o mais importante prémio literário do seu país, o prémio Nike; em 2018, foi finalista do prémio Fémina Estrangeiro e vencedora do Prémio Internacional Man Booker. Os seus livros estão traduzidos em trinta línguas.

Livros editados em Portugal



CONDUZ O TEU ARADO SOBRE OS OSSOS DOS MORTOS

Numa remota aldeia polaca, a excêntrica Janina Duszejko, professora reformada, divide os seus dias a traduzir a poesia de William Blake e a observar os sinais da astrologia, fazendo por manter-se afastada das pessoas e próxima dos animais, cuja companhia prefere; mas a pacatez dos seus dias vê-se interrompida quando começam a aparecer mortos vários membros do clube de caça local. Certa de encontrar respostas, Janina decide lançar-se na investigação do caso, chegando a uma estranha teoria que espalhará o terror pela comunidade.

Sob a máscara de policial noir ou fábula macabra, Conduz o Teu Arado Sobre os Ossos dos Mortos é um romance mordaz e desconcertante que questiona a nossa posição acerca dos direitos dos animais e responsabilidade sobre a natureza, bem como todas as ideias preconcebidas sobre a loucura, a justiça e a tradição.

“O mundo é uma prisão cheia de sofrimento, construída de modo que, para se sobreviver, seja preciso infligir dor a outros. (…) Que mundo é este? Um corpo transformado em calçado, em almôndegas, em salsichas, em tapete estendido junto à cama, em caldo feito com os ossos de outro ser… Sapatos, sofás, malas de pendurar ao ombro feitos da barriga de outros seres, aquecer-se à custa do pelo de outrem, comer o corpo de outrem, cortá-lo aos pedaços e fritá-lo no óleo…. Será verdade? Será possível tal pesadelo macabro, tamanha matança, cruel, desapaixonada, mecânica, sem pesos na consciência, sem a mínima reflexão, reflexão que é afinal o objeto dos engenhosos campos da Filosofia e da Teologia?” 

“Eu tinha a minha Teoria sobre estas bengalas linguísticas: todo o Homem tem uma palavra da qual abusa. Ou que emprega de modo inadequado. Estas palavras são a chave para a nossa mente. O Senhor «Ao que parece», o Senhor «Geralmente», a Senhora «Provavelmente», o Senhor «Foda-se», a Senhora «Não Acha?», o senhor «Como Se». O Presidente era o Senhor «Verdade». É claro que existem modas para usar determinadas palavras, tal como existem modas que, de repente, levam as pessoas, movidas por um desvario qualquer, a calçar botas idênticas ou a usar roupas iguais; o mesmo acontece com as pessoas que de repente começam a usar uma palavra em concreto. Nos últimos tempos, esteve em voga o «geralmente»; agora, domina o «basicamente».” 

In Conduz o Teu Arado sobre os Ossos dos Mortos (p. 117; p. 197)