terça-feira, 10 de março de 2020

Escritor do mês | março


ALEXANDRE O' NEILL
(1924/1986)


Poeta português, Alexandre Manuel Vahia de Castro O'Neill de Bulhões, descendente de irlandeses, nasceu a 19 de dezembro de 1924, em Lisboa, e morreu a 21 de agosto de 1986, na mesma cidade. Para além de se ter dedicado à poesia, Alexandre O'Neill exerceu a atividade profissional de técnico publicitário. Fundador do Grupo Surrealista de Lisboa, com Mário Cesariny, António Pedro, José-Augusto França, diretamente influenciado pelo surrealismo bretoniano, desvinculou-se do grupo a partir de Tempo de Fantasmas (1951), embora a passagem pelo surrealismo marque indelevelmente a sua postura estética. A sua distanciação em relação a este movimento não obstou a que um estilo sarcástico e irónico muito pessoal se impregnasse de algumas características do Surrealismo, abordando noutros passos o Concretismo, preocupando-se não em fazer "bonito", mas sim "bom e expressivo". Para Clara Rocha, a poesia de Alexandre O'Neill coincide com o programa surrealista a dois níveis: "a libertação total do homem e a libertação total da arte. O que implica: primeiro, uma poesia de 'intervenção', exortando os homens a libertarem-se dos constrangimentos de toda a ordem que os tolhem e oprimem (familiares, sociais, morais, quotidianos, psicológico, políticos, etc.); segundo, a libertação da palavra de todas as formas de censura (estética, moral, lógica, do bom senso, etc.)" (cf. ROCHA, Clara - prefácio a Poesias Completas, 1982, p. 12). Segundo o crítico Fernando J. B. Martinho, se "o surrealismo ortodoxo põe a sua crença na existência de um 'ponto do espírito em que [...] o real e o imaginário' deixariam 'de ser percebidos contraditoriamente', em Alexandre O' Neill toda a busca parece centrar-se na 'vida' e no 'real'" (Quadernici Portoghesi, p. 40).


Recebeu, pelas suas Poesias Completas, o Prémio da Crítica do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários (1983).

A 10 de Junho de 1990, a título póstumo, foi feito Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico.

A Biblioteca Alexandre O'Neill, em Constância, alberga, por doação do próprio escritor, parte do seu espólio. Ali, pode-se ler os livros que pertenceram a O'Neill, muitos deles com anotações suas ou dedicatórias dos autores.

Bibliografia
Poesia
Edições originais
  • 1948 – A Ampola Miraculosa, Lisboa, Cadernos Surrealistas.
  • 1951 – Tempo de Fantasmas, Cadernos de Poesia, nº11.
  • 1958 – No Reino da Dinamarca, Lisboa, Guimarães.
  • 1960 – Abandono Vigiado, Lisboa, Guimarães.
  • 1962 – Poemas com Endereço, Lisboa, Moraes.
  • 1965 – Feira Cabisbaixa, Lisboa, Ulisseia.
  • 1969 – De Ombro na Ombreira, Lisboa, Dom Quixote.
  • 1972 – Entre a Cortina e a Vidraça, Lisboa, Estúdios Cor.
  • 1979 – A Saca de Orelhas, Lisboa, Sá da Costa.
  • 1981 - As Horas Já de Números Vestidas (Em Poesias Completas (1951-1981))
  • 1983 - Dezanove Poemas (Em Poesias Completas (1951-1983))
Antologias feitas ao longo da vida
  • 1967 – No Reino da Dinamarca – Obra Poética (1951-1965), 2.ª edição, revista e aumentada, Lisboa, Guimarães.
  • 1974 – No Reino da Dinamarca – Obra Poética (1951-1969), 3.ª edição, revista e aumentada, Lisboa, Guimarães.
  • 1981 – Poesias Completas (1951-1981), Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1982.
  • 1983 – Poesias Completas (1951-1983), 2.ª edição, revista e aumentada, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1984.
  • 1986 – O Princípio de Utopia, O Princípio de Realidade seguidos de Ana Brites, Balada tão ao Gosto Popular Português & Vários Outros Poemas, Lisboa, Moraes.


Antologias póstumas
  • 2000 – Poesias Completas, com inclusão de dispersos, introd. de Miguel Tamen, Lisboa, Assírio & Alvim; 2a ed. rev. 2001; 3a ed. 2002; 4a ed. 2005; 5a ed. 2007.
  • 2005 – Anos 1970. Poemas Dispersos, M. A. Oliveira e F. Cabral Martin (eds.), Lisboa, Assírio & Alvim; 2a, 2009.
  • Poesias Completas & Dispersos, Lisboa, Assírio & Alvim, 2018

Prosa
  • 1970 - As Andorinhas não Têm Restaurante, Lisboa, Dom Quixote. (crónicas)
  • 1980 - Uma Coisa em Forma de Assim, 2ª edição, revista e aumentada, Lisboa, Presença. (contos e crónicas)
Traduções feitas por O'Neill
  • 1950 – Nora Mitrani, A Razão Ardente (Do Romantismo ao Surrealismo), Cadernos Surrealistas, Lisboa.
  • 1959 – Maiakovski, O Percevejo, Lisboa, Editorial Gleba.
  • 1960 – Dostoievski, O Jogador, Lisboa, Guimarães.
  • 1961-63 – Bertolt BrechtTeatro I e II, (em colaboração com Ilse Losa), Lisboa, Portugália Editora.
  • 1962 – Alfred JarryMestre Ubu, (em colaboração com Luís de Lima), Lisboa, Minotauro
Antologias feitas por O’Neill

  • 1959 – Gomes Leal – Antologia Poética (em colaboração com F. da Cunha Leão), Lisboa, Guimarães.
  • 1962 – Teixeira de Pascoaes – Antologia Poética (em colaboração com F. da Cunha Leão), Lisboa, Guimarães.
  • 1962 – Carl Sandburg – Antologia Poética, Lisboa, Edições Tempo.
  • 1963 – João Cabral de Melo Neto – Poemas Escolhidos, Lisboa, Portugália.
  • 1969 – Vinicius de Moraes – O Poeta Apresenta o Poeta, Lisboa, D. Quixote.
  • 1977 – Poesía Portuguesa Contemporánea / Poesia Portuguesa Contemporânea (em colaboração com a Secção de Literatura da Direção Geral de Ação Cultural), edição bilingue, Lisboa, Secretaria de Estado da Cultura.
Discos de poesia

  • Alexandre O’Neill diz poemas da sua autoria – coleção «A Voz e o Texto», Discos Decca, PEP 1010.
  • Os Bichos também são gente – coleção «A Voz e o Texto», Discos Decca, PEP 1278.
Filmografia
Guionista
  • 1962 – Dom Roberto
  • 1963 – Pássaros de Asas Cortadas
  • 1967 – Sete Balas Para Selma
  • 1969 – Águas Vivas
  • 1970 – A Grande Roda
  • 1975 – Schweik na Segunda Guerra Mundial (TV)
  • 1976 – Cantigamente (3 episódios da série)
  • 1978 – Nós por cá Todos Bem
  • 1979 - Ninguém (TV)
  • 1979 - Lisboa (TV)


Amigo

Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».
Amigo é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!

Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.

Amigo é a solidão derrotada!

Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!
Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'

GAIVOTA
Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se um português marinheiro
dos sete mares andarilho
fosse, quem sabe, o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.

Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.

Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.

Que perfeito coração
morreria no meu peito,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
Poema de Alexandre O'Neill, cantado por Amália Rodrigues


Um poema...


ENTÃO QUERES SER UM ESCRITOR?

se não sai de ti a explodir
apesar de tudo,
não o faças.
a menos que saia sem perguntar do teu
coração, da tua cabeça, da tua boca
das tuas entranhas,
não o faças.
se tens que estar horas sentado
a olhar para um ecrã de computador
ou curvado sobre a tua
máquina de escrever
procurando as palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes para teres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma e outra vez,
não o faças.
se dá trabalho só pensar em fazê-lo,
não o faças.
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.

se tens que esperar para que saia de ti
a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.

se tens que o ler primeiro à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou pais ou a quem quer que seja,
não estás preparado.

não sejas como muitos escritores,
não sejas como milhares de
pessoas que se consideram escritores,
não sejas chato nem aborrecido e
pedante, não te consumas com auto-
— devoção.
as bibliotecas de todo o mundo têm
bocejado até
adormecer com os da tua espécie.
não sejas mais um.
não o faças.
a menos que saia da
tua alma como um míssil,
a menos que o estar parado
te leve à loucura ou
ao suicídio ou homicídio,
não o faças.
a menos que o sol dentro de ti
te queime as tripas,
não o faças.

quando chegar mesmo a altura,
e se foste escolhido,
vai acontecer
por si só e continuará a acontecer
até que tu morras ou morra em ti.

não há outra alternativa.

e nunca houve.

Charles Bukowski, in Os Cães Ladram Facas
[Antologia poética]



Charles Bukowski nasceu na Alemanha, em 1920, mas cresceu em Los Angeles, onde viveu durante cinquenta anos. Publicou o seu primeiro conto em 1944, quando tinha vinte e quatro anos, e começou a escrever poesia com trinta e cinco anos. Morreu em 1994, aos setenta e três anos, pouco tempo depois de completar o seu último romance, Pulp. Viu publicados mais de quarenta e cinco livros de prosa e poesia, incluindo os romances Post Office (1971), Factotum (1975), Women (1978), Ham on Rye (1982), Hollywood (1989) e Pulp (1994). É um dos autores americanos contemporâneos mais conhecidos a nível mundial e, possivelmente, o poeta americano mais influente e imitado de sempre.

segunda-feira, 9 de março de 2020

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