ALEXANDRE
O' NEILL
(1924/1986)
Poeta
português, Alexandre Manuel Vahia de Castro O'Neill de Bulhões, descendente de
irlandeses, nasceu a 19 de dezembro de 1924, em Lisboa, e morreu a 21 de agosto
de 1986, na mesma cidade. Para além de se ter dedicado à poesia, Alexandre
O'Neill exerceu a atividade profissional de técnico publicitário. Fundador do
Grupo Surrealista de Lisboa, com Mário Cesariny, António Pedro, José-Augusto
França, diretamente influenciado pelo surrealismo bretoniano, desvinculou-se do
grupo a partir de Tempo de Fantasmas (1951), embora a passagem pelo surrealismo
marque indelevelmente a sua postura estética. A sua distanciação em relação a
este movimento não obstou a que um estilo sarcástico e irónico muito pessoal se
impregnasse de algumas características do Surrealismo, abordando noutros passos
o Concretismo, preocupando-se não em fazer "bonito", mas sim
"bom e expressivo". Para Clara Rocha, a poesia de Alexandre O'Neill
coincide com o programa surrealista a dois níveis: "a libertação total do
homem e a libertação total da arte. O que implica: primeiro, uma poesia de
'intervenção', exortando os homens a libertarem-se dos constrangimentos de toda
a ordem que os tolhem e oprimem (familiares, sociais, morais, quotidianos,
psicológico, políticos, etc.); segundo, a libertação da palavra de todas as
formas de censura (estética, moral, lógica, do bom senso, etc.)" (cf. ROCHA,
Clara - prefácio a Poesias Completas, 1982, p. 12). Segundo o crítico Fernando
J. B. Martinho, se "o surrealismo ortodoxo põe a sua crença na existência
de um 'ponto do espírito em que [...] o real e o imaginário' deixariam 'de ser
percebidos contraditoriamente', em Alexandre O' Neill toda a busca parece
centrar-se na 'vida' e no 'real'" (Quadernici Portoghesi, p. 40).
Recebeu,
pelas suas Poesias Completas, o Prémio da Crítica do Centro
Português da Associação Internacional de Críticos Literários (1983).
A
10 de Junho de 1990, a título póstumo, foi feito Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima
e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico,
Literário e Artístico.
A
Biblioteca Alexandre O'Neill, em Constância, alberga, por
doação do próprio escritor, parte do seu espólio. Ali, pode-se ler os livros
que pertenceram a O'Neill, muitos deles com anotações suas ou dedicatórias dos
autores.
Bibliografia
Poesia
Edições originais
- 1948 – A Ampola
Miraculosa, Lisboa, Cadernos Surrealistas.
- 1951 – Tempo de
Fantasmas, Cadernos de Poesia, nº11.
- 1958 – No Reino da
Dinamarca, Lisboa, Guimarães.
- 1960 – Abandono Vigiado,
Lisboa, Guimarães.
- 1962 – Poemas com
Endereço, Lisboa, Moraes.
- 1965 – Feira Cabisbaixa,
Lisboa, Ulisseia.
- 1969 – De Ombro na
Ombreira, Lisboa, Dom Quixote.
- 1972 – Entre a Cortina
e a Vidraça, Lisboa, Estúdios Cor.
- 1979 – A Saca de
Orelhas, Lisboa, Sá da Costa.
- 1981 - As Horas Já de
Números Vestidas (Em Poesias Completas (1951-1981))
- 1983 - Dezanove Poemas (Em Poesias
Completas (1951-1983))
Antologias feitas ao longo da
vida
- 1967 – No Reino da
Dinamarca – Obra Poética (1951-1965), 2.ª edição, revista e aumentada,
Lisboa, Guimarães.
- 1974 – No Reino da
Dinamarca – Obra Poética (1951-1969), 3.ª edição, revista e aumentada,
Lisboa, Guimarães.
- 1981 – Poesias
Completas (1951-1981), Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda,
1982.
- 1983 – Poesias
Completas (1951-1983), 2.ª edição, revista e aumentada, Lisboa,
Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1984.
- 1986 – O Princípio de
Utopia, O Princípio de Realidade seguidos de Ana Brites, Balada tão ao
Gosto Popular Português & Vários Outros Poemas, Lisboa, Moraes.
Antologias
póstumas
- 2000 – Poesias
Completas, com inclusão de dispersos, introd. de Miguel Tamen, Lisboa,
Assírio & Alvim; 2a ed. rev. 2001; 3a ed. 2002; 4a ed. 2005; 5a ed.
2007.
- 2005 – Anos 1970.
Poemas Dispersos, M. A. Oliveira e F. Cabral Martin (eds.), Lisboa,
Assírio & Alvim; 2a, 2009.
- Poesias Completas &
Dispersos, Lisboa, Assírio & Alvim, 2018
Prosa
- 1970 - As Andorinhas
não Têm Restaurante, Lisboa, Dom Quixote. (crónicas)
- 1980 - Uma Coisa em
Forma de Assim, 2ª edição, revista e aumentada, Lisboa, Presença.
(contos e crónicas)
Traduções feitas por O'Neill
- 1950 – Nora Mitrani, A
Razão Ardente (Do Romantismo ao Surrealismo), Cadernos Surrealistas,
Lisboa.
- 1959 – Maiakovski, O
Percevejo, Lisboa, Editorial Gleba.
- 1960 – Dostoievski, O
Jogador, Lisboa, Guimarães.
- 1961-63 – Bertolt
Brecht, Teatro I e II, (em colaboração com Ilse
Losa), Lisboa, Portugália Editora.
- 1962 – Alfred
Jarry, Mestre Ubu, (em colaboração com Luís de
Lima), Lisboa, Minotauro
Antologias
feitas por O’Neill
- 1959 – Gomes Leal – Antologia
Poética (em colaboração com F. da Cunha Leão), Lisboa, Guimarães.
- 1962 – Teixeira de Pascoaes – Antologia
Poética (em colaboração com F. da Cunha Leão), Lisboa, Guimarães.
- 1962 – Carl Sandburg – Antologia
Poética, Lisboa, Edições Tempo.
- 1963 – João Cabral de Melo Neto – Poemas
Escolhidos, Lisboa, Portugália.
- 1969 – Vinicius de Moraes – O
Poeta Apresenta o Poeta, Lisboa, D. Quixote.
- 1977 – Poesía
Portuguesa Contemporánea / Poesia Portuguesa Contemporânea (em
colaboração com a Secção de Literatura da Direção Geral de Ação Cultural),
edição bilingue, Lisboa, Secretaria de Estado da Cultura.
Discos de poesia
- Alexandre O’Neill diz poemas da
sua autoria – coleção «A Voz e o
Texto», Discos Decca, PEP 1010.
- Os Bichos também são gente –
coleção «A Voz e o Texto», Discos Decca, PEP 1278.
Filmografia
Guionista
- 1962 – Dom Roberto
- 1963 – Pássaros de Asas
Cortadas
- 1967 – Sete Balas Para
Selma
- 1969 – Águas Vivas
- 1970 – A Grande Roda
- 1975 – Schweik na
Segunda Guerra Mundial (TV)
- 1976 – Cantigamente (3
episódios da série)
- 1978 – Nós por cá Todos
Bem
- 1979 - Ninguém (TV)
- 1979 - Lisboa (TV)
Amigo
Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra «amigo».
Inaugurámos a palavra «amigo».
Amigo é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
Amigo é a solidão derrotada!
Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!
Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
Amigo (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de inimigo!
Amigo é o erro corrigido,
Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.
Amigo é a solidão derrotada!
Amigo é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
Amigo vai ser, é já uma grande festa!
Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'
GAIVOTA
Se uma gaivota viesse
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se um português marinheiro
dos sete mares andarilho
fosse, quem sabe, o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.
Que perfeito coração
morreria no meu peito,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
trazer-me o céu de Lisboa
no desenho que fizesse,
nesse céu onde o olhar
é uma asa que não voa,
esmorece e cai no mar.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se um português marinheiro
dos sete mares andarilho
fosse, quem sabe, o primeiro
a contar-me o que inventasse,
se um olhar de novo brilho
no meu olhar se enlaçasse.
Que perfeito coração
no meu peito bateria,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde cabia
perfeito o meu coração.
Se ao dizer adeus à vida
as aves todas do céu
me dessem na despedida
o teu olhar derradeiro,
esse olhar que era só teu,
amor que foste o primeiro.
Que perfeito coração
morreria no meu peito,
meu amor, na tua mão,
nessa mão onde perfeito
bateu o meu coração.
Poema de Alexandre O'Neill, cantado por
Amália Rodrigues
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